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Bosch no Brasil
14/03/2025

Agricultura sustentável: como produzir comida para o mundo todo e preservar o meio ambiente

Agricultura sustentável: como produzir comida para o mundo todo e preservar o meio ambiente

Vez ou outra aparece alguém dizendo que vai faltar comida no mundo. A primeira pessoa célebre a defender essa ideia foi o economista britânico Thomas Malthus (1766-1834): o crescimento da produção, dizia ele, não seria suficiente para compensar o crescimento da população. O mais recente famoso a abraçar a tese foi o vilão intergalático Thanos, dos filmes Os Vingadores, da Marvel: para ele, o universo é finito, os recursos são finitos, então o jeito é sair no braço com os super-heróis e exterminar metade da população.

Malthus estava errado e Thanos, claro, estava barbaramente errado. A evolução tecnológica catapultou a produção agrícola; o avanço da escolaridade fez o número de habitantes crescer bem menos do que antes. Alguns desafios recentes, contudo, voltaram a acordar o fantasma de Malthus:

  • A população aumenta mais devagar, mas come melhor (uma notícia excelente que implica, porém, mais demanda para a agricultura).
  • Ao contrário do que ocorreu em todas as vezes anteriores, agora há menos gente trabalhando no campo do que nas cidades.
  • A atividade agrícola não pode agravar a crise climática. Ela precisa ser sustentável: sem desmatamento, sem prejuízo dos cursos d’água.

Estamos prontos para esses desafios? É o que veremos neste texto. Alerta de spoiler: sim, estamos, mas para isso precisaremos de cada vez mais tecnologia no campo.

Mais gente comendo melhor

A população do planeta crescia por volta de 2% ao ano na década de 1960; hoje, o ritmo não chega a 1%, segundo a Divisão de População da ONU. Ainda assim, o mundo atingiu a marca de 8 bilhões de pessoas em 2023 e deve chegar a 10 bilhões em 2050. É uma alta expressiva, de 25%. No entanto, para quem trabalha com agricultura não é esse o número que mais chama atenção. “O aumento da demanda por alimentos deve ser de 45%. Será um desafio para a humanidade”, resume o vice-presidente para Agricultura Inteligente da Bosch América Latina, Mathias Schelp.

A diferença entre os 25% e os 45% se explica pelas mudanças nos hábitos alimentares. Entre elas, uma que embute ótima notícia: a queda do número de pessoas que passam fome. Em 2000, 13% da população mundial era subnutrida, de acordo com a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO). O percentual recuou nos anos posteriores e chegou a 7% em 2017. Voltou a subir depois e recentemente estabilizou-se em torno de 9%. Mas deve declinar para 6,8% até 2030, prevê o órgão da ONU.

O consumo médio diário no mundo deve alcançar 3.050 quilocalorias em 2030, segundo a FAO — um quarto a mais do que em meados da década de 1960.

Mais gente comendo melhor

Menos gente no campo

A tarefa de incrementar o cultivo e a colheita terá de ser realizada com menos gente. Já faz algumas décadas que o número de agricultores vem declinando. No início dos anos 90, 43% dos trabalhadores dedicavam-se a atividades na zona rural, de acordo com a FAO e a Organização Internacional do Trabalho (OIT). O percentual desabou desde então, com ligeira alta apenas no primeiro ano da pandemia, e chegou a 26% em 2023. “Haverá menos gente produzindo para mais gente”, sintetiza Francisco Matturro, diretor-executivo da Rede ILPF (Integração Lavoura-Pecuária-Floresta).

Menos gente no campo

Menos áreas disponíveis

Nos últimos 30 anos, a área ocupada por florestas no planeta recuou pouco menos de 2%, ainda que se mantenha como o principal tipo de ocupação do solo, de acordo com a FAO. As áreas com cobertura vegetal menos espessa também diminuíram (1%). Em décadas e séculos anteriores, a queda foi ainda mais intensa, sobretudo nos países europeus. Já o espaço ocupado por área agrícola e pastagens se ampliou (3% e 2%, respectivamente). Algumas vezes, esse aumento ocorreu em detrimento das florestas, com desmatamento para abertura de lavouras e, sobretudo, pastagens.

Não dá mais para ser assim. As mudanças climáticas tornaram mais frequentes chuvas muito fortes, secas muito severas e dias muito quentes. O prejuízo é de todos, inclusive da produção agrícola. As enchentes que castigaram o Rio Grande do Sul em 2024, por exemplo, afetaram mais de 206 mil agricultores, levaram à perda de 3 milhões de toneladas de soja e à morte de mais de 1 milhão de galinhas.

Nestes tempos, a agricultura sustentável torna-se ainda mais essencial. O aumento da produção terá de ser feito sem impactar florestas e áreas de preservação. O Brasil, em razão de suas condições naturais e de técnicas aplicadas ao longo das décadas, ainda tem disponibilidade de terras, por meio da substituição de pastagens degradadas.

Menos áreas disponíveis

O papel fundamental do Brasil

O Brasil será essencial para a humanidade superar o triplo desafio de alimentar mais gente, com menos trabalhadores no campo e sem desmatamento. O país “é o maior produtor de diversas culturas”, como destaca Mathias Schelp, da Bosch. A lavoura brasileira, segundo ele, é responsável por alimentar 1,5 bilhão de pessoas. Essa posição está ligada a diversos fatores:

Temos um território vasto
Ainda que a maior parte do Brasil seja ocupada por florestas, a área agricultável é grande e diversa — abrange regiões mais úmidas e mais secas, de encosta e de planície, de solo mais pobre ou mais fértil. Além disso, temos espaço para expandir as plantações em áreas hoje ainda ocupadas por pastagens degradadas. Um estudo da Embrapa indica que 28 milhões de hectares desse tipo têm potencial para receber culturas agrícolas – uma área maior que a de todo o estado de São Paulo.

Nosso clima é favorável
“Estamos num país tropical, temos sol o ano todo. Podemos produzir o ano inteiro, porque temos fotossíntese o ano inteiro”, observa Matturro.

Temos tradição em pesquisa
O Brasil conta com diversos institutos de pesquisa em agropecuária — o mais antigo da América Latina, por exemplo, fica em Campinas (SP), o Instituto Agronômico (IAC). A Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) está presente em várias regiões, com técnicos muito preparados.

Usamos tecnologia de ponta
“A tecnologia adotada no Brasil, em todas as áreas da cadeia, é de ponta”, diz Schelp. “Em agricultura, não há defasagem tecnológica do Brasil em relação ao resto do mundo. O país tem todos os requisitos para ser líder no mercado global”.

Temos práticas de plantio mais sustentáveis
Só agora alguns países estão adotando procedimentos ambientais que o Brasil usa há décadas. Uma delas é o plantio direto, método desenvolvido pelo produtor paranaense Herbert Bartz no início da década de 1970. “Ele foi chamado de louco, mas era um visionário”, elogia Francisco Matturro. Nesse sistema, o plantio é feito sem revolver o solo, aproveitando o resto das plantas colhidas, como a palha. Assim, há “cobertura de solo, proteção contra o sol, contra a erosão e contra o excesso de chuva”, diz o diretor-executivo da Rede ILPF.

Outro avanço é ter duas safras no mesmo ano. A segunda safra, antes chamada de safrinha, hoje responde por parte importante da produção agrícola. “De cada três sacas de milho produzidas no Brasil, duas são de segunda safra. O algodão brasileiro é todo de segunda safra — e somos o segundo maior produtor e o primeiro exportador do mundo”, afirma Matturro. Com duas safras, a ocupação do solo é quase contínua. “Assim, não deixamos o solo descoberto em nenhum momento do ano, estamos sempre retendo CO2 no solo”, enfatiza Schelp.

O terceiro salto sustentável, avalia Matturro, é a integração entre lavoura, pecuária e floresta. Nesse sistema, as atividades agrícolas, pecuárias e florestais podem ser alternadas no tempo (rotação) ou feitas simultaneamente (consorciação). A estratégia teve início em 2006, numa propriedade de 100 hectares. Hoje, alcança cerca de 22 milhões de hectares.

O papel fundamental da tecnologia

O papel fundamental da tecnologia

O antigo temor de que não haveria como alimentar uma população crescente foi por água abaixo sobretudo em razão do avanço tecnológico. A mecanização da agricultura e o melhoramento genético, ao longo do século 20, garantiram o aumento da produção. Não será diferente no século 21. O triplo desafio (produzir mais, produzir com menos gente e sem desmatar) deve ser superado com apoio da tecnologia.

“Tecnologia não é só um produto complexo, com eletrônica. Tecnologia também é a aplicação das melhores práticas agronômicas para determinada região. Tecnologia também é olhar para o ciclo todo e fazer a melhor escolha sobre qual semente plantar naquela região, avaliar qual cultivar ou qual cultura tem mais potencial”, aponta Schelp, da Bosch.

Tecnologia para fazer mais com menos

Tecnologia para fazer mais com menos

Um tipo de avanço que será decisivo na produção sustentável de alimentos é a agricultura de precisão, ou agricultura inteligente — justamente um dos focos da Bosch na área agrícola. Ela envolve fazer a melhor aplicação possível dos insumos.

Não se trata de programar um equipamento para simplesmente espalhar fertilizante, semente ou herbicida a torto e a direito na lavoura, como se faz na mecanização básica. Na agricultura inteligente, a distribuição é variável. “O produtor decide qual é a quantidade que vai colocar em determinada área do solo”, explica Schelp. Um projeto da Embrapa e da Bosch aumentou a produtividade em 8% numa plantação de soja e em 3% numa de algodão ao distribuir as sementes de acordo com as características de cada parte da terra. “Você usa menos insumos, menos sementes e produz mais”, resume o vice-presidente de Agricultura Inteligente.

A Bosch, numa joint venture com a Basf chamada One Smart Spray, desenvolveu um sistema que escrutina a plantação e verifica se há erva daninha. “Ele só aplica herbicida se houver erva daninha. Isso reduz a utilização de insumos e aumenta a produtividade”, diz Schelp.

Tecnologia para reduzir o uso de água

A agricultura é responsável por mais da metade do uso da água no Brasil — 50% vão para irrigação e 1,5% para abastecimento rural. Se somar o uso para a pecuária (7,9%), chega-se a quase 60%, segundo o relatório Conjuntura dos Recursos Hídricos no Brasil 2024, da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA).

Schelp afirma que, embora possa parecer alta, a porcentagem é menor do que a média mundial, de 70%. “Nos Estados Unidos, por exemplo, é 85%”. Além disso, pondera, esse volume de água está sendo usado para duas safras anuais, e não só uma, como ocorre em boa parte dos mercados do exterior.

De qualquer forma, a questão não é tanto o uso da água — que retorna para o solo ou para os rios — mas a eventual contaminação. Nesse sentido, a agricultura de precisão tem muito a colaborar: ao reduzir a utilização de insumos, também reduz a degradação hídrica. Por meio dela, é possível fazer “pulverização localizada e irrigação localizada, colocando a quantidade necessária”, observa Francisco Matturro.

Tecnologia para reduzir o uso de água

Tecnologia para reduzir as perdas

Embora a desnutrição seja menor do que no passado, muita gente ainda passa fome: 733 milhões de pessoas. Mas isso não acontece por falta de comida — o mundo produz 24% mais do que o necessário para alimentar a população inteira, segundo a FAO. Essa discrepância entre abundância na produção e escassez de uma parcela da população tem várias raízes, em especial as desigualdades sociais e econômicas. Há também problemas de logística e de perdas, e neles a tecnologia pode ter papel mais direto.

Porcentagem de perdas/desperdício de alimentos, por grupos de produtos e etapas da cadeia na América Latina

Alimentos Produção
agropecuária (%)
Manipulação e
armazenagem (%)
Processamento e
empacotamento
(%)
Distribuição (%) Consumo (%)
Alimentos
Cereais
Produção
agropecuária (%)
6
Manipulação e
armazenagem (%)
4
Processamento e
empacotamento
(%)
2,0 – 7,0
Distribuição (%)
4
Consumo (%)
10
Alimentos
Raízes e tubérculos
Produção
agropecuária (%)
14
Manipulação e
armazenagem (%)
14
Processamento e
empacotamento
(%)
12
Distribuição (%)
3
Consumo (%)
4
Alimentos
Leguminosas e oleaginosas
Produção
agropecuária (%)
6
Manipulação e
armazenagem (%)
3
Processamento e
empacotamento
(%)
8
Distribuição (%)
2
Consumo (%)
2
Alimentos
Frutas e hortaliças
Produção
agropecuária (%)
20
Manipulação e
armazenagem (%)
10
Processamento e
empacotamento
(%)
20
Distribuição (%)
12
Consumo (%)
10
Alimentos
Carnes
Produção
agropecuária (%)
5,3
Manipulação e
armazenagem (%)
1,1
Processamento e
empacotamento
(%)
5
Distribuição (%)
5
Consumo (%)
6
Alimentos
Peixes e frutos do mar
Produção
agropecuária (%)
5,7
Manipulação e
armazenagem (%)
5
Processamento e
empacotamento
(%)
9
Distribuição (%)
10
Consumo (%)
4
Alimentos
Leite
Produção
agropecuária (%)
3,5
Manipulação e
armazenagem (%)
6
Processamento e
empacotamento
(%)
2
Distribuição (%)
8
Consumo (%)
4

Fonte: Perdas e desperdícios de alimentos: causas principais, Instituto BRF e Fundação José Luiz Egydio Setúbal

Os avanços recentes da agricultura inteligente permitem reduzir as perdas em diversas etapas, como semeadura e colheita. Matturro dá um exemplo. A colheita feita durante a manhã encontra palhas mais pesadas, em razão da umidade ou do orvalho da madrugada. Quando o dia esquenta, a umidade evapora e a palha fica mais leve. “No passado, o operador da colheitadeira tinha que descer e ir regulando a máquina conforme o sol ia chegando. Havia uma perda muito grande. A própria trilha das máquinas provocava perdas significativas. Hoje as máquinas têm controle de umidade do grão que está sendo colhido e controle de perdas.”

Tecnologia para produzir com sustentabilidade

Os avanços que possibilitam produzir mais alimentos num mesmo espaço ajudam a evitar a expansão da agricultura em áreas florestais. A agricultura inteligente, ao elevar a produtividade, possibilita que os mercados sejam abastecidos sem que se precise derrubar árvores.

Uma contribuição decisiva para a sustentabilidade é o que Matturro chama de terceira grande revolução da agricultura brasileira: a integração lavoura-pecuária-floresta. Esse método reduz o desmatamento ao tornar mais produtivas as áreas já utilizadas — principalmente em regiões como o Cerrado e a Amazônia, onde a disseminação da agropecuária ainda provoca perdas de floresta.

Outra grande vantagem da integração é recuperar pastagens degradadas (o Brasil tem 90 milhões de hectares com pastagens desse tipo, segundo a Embrapa). “Uma pastagem boa, de alta qualidade e alto valor proteico, sequestra carbono e produz mais carne por hectare”, afirma Matturro.

Ele e Schelp frisam que, para superar o triplo desafio, é necessário fazer os diversos tipos de incrementos tecnológicos chegarem às pequenas e médias propriedades. “A Bosch está começando a produzir sistema de plantio em taxa variável para máquinas menores, mais acessíveis ao pequeno e médio produtor”, conta Schelp. “Conforme as tecnologias forem sendo adotadas em larga escala, elas se tornarão mais acessíveis também para esse mercado”, conclui.

Do Brasil para o mundo

Do Brasil para o mundo

Em 2025, a Bosch Brasil assume as operações de desenvolvimento e manufatura de tecnologias de agricultura inteligente para o grupo Bosch em todo o mundo, com foco em soluções de plantio, fertilização e pulverização por meio de automatização e digitalização.

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